Arquivo para Didier Eribon

ofender não é crime?

Posted in comportamento, direitos GLBTT, diversidade, educação, violência with tags , , on 10/08/2009 by Jisuis

Fato 1:

herrera Em 29 de abril de 2009 Jahem Herrera, 11 anos, suicidou-se na Georgia, USA. Embora não tenha sido efetivamente confirmado pelas autoridades, a causa especulada é dramática: injúria por ser gay.

Jahem era perseguido e injuriado na escola diariamente. Queixou-se disto aos “adultos responsáveis”. Nada sucedeu.

Matou-se.

11 anos. Uma criança de 11 anos se matou porque não suportou a violência travestida do quotidiano das “brincadeiras” cruéis.

Fato 2:

Há cerca 20 dias a mãe de um ex-paciente ligou para mim [nem questiono os superpoderes que permitem a descoberta de meus celulares]. Seu sobrinho de 13 anos havia tentado o suicídio: quase amputara o próprio pênis e cortara os pulsos. Sua morte foi evitada por um cartão de crédito esquecido na mesa da sala, que fez sua mãe voltar para casa.

O motivo? Injúrias por ele ser gay. Ofensas verbais, perseguições e violências. De colegas de colégio, com a conivência de professores que  dizem “deixam as crianças resolverem isto” quando não falam que “choramingar é coisa de viado”. Do pai, dizendo que ele “só subiria na vida se fosse de costas”.  Do primeiro amor, um ex-amigo que, quando soube da homossexualidade, deu-lhe uma surra e disse que ele deveria ter vergonha por ser nojento assim.

Uma nota suicida dolorida e deprimente deixava claro o quanto ele se sentiu errado, feio e ruim por ter frustrado todas as expectativas de pais e amigos por “amar quem não devo”. O quanto ele não queria magoar ninguém, mas “não posso deixar de ser quem eu sou e virar outra pessoa. Só posso deixar de ser”.

Por que ela me ligou? Para que eu atendesse os pais do garoto, para que “eles não ajudassem X a tentar se matar de novo”.

ddierA “nomeação” produz uma conscientização de si mesmo como um “outro” que os outros transformaram em “objeto”.

(…)

A injúria é um ato de linguagem ou uma série de atos de linguagem pela qual um lugar particular é atribuído no mundo àquele que dela é destinatário. (…) A injúria produz efeitos profundos na consciência de um indivíduo pelo que ela diz a ele: “Eu te assimilo a”; “Eu te reduzo a”.

Didier Eribon in Reflexões Sobre a Questão Gay: Humanidade, Sexualidade e Erotismo.

Eu te reduzo a… Tenho poderes sobre sua existência, tenho julgamentos sobre seus desejos, tenho sentenças sobre suas vontades. Impero sobre você e determino o certo e o errado da sua vida.

Água mole em pedra dura… Como em 1984 [George Orwell], de tanto repetir, humilhar, derrotar, quebrar as vontades e esperanças do sujeito, acaba-se por enfiar goela abaixo a “verdade social” que deve ser seguida: 2 + 2 = 5.

Ou, no caso de Jahem e X, “morram suas bichas”.

São humanos, são pessoas, são crianças. Morrem feito moscas e são importantes feito moscas para um bando de “representantes políticos” que acham prioridade assegurar que as igrejas não se sintam constrangidas [pelo PLC 122] no seu direito de ter preconceito.

Moscas…

Durma com um barulho destes.

munch-grito

O Grito , obra de Edvard Munch (1863 — 1944)